Funeral (2004)
O álbum de estreia dos Arcade Fire torna-se redentor pelas dedicatórias aos familiares falecidos – é corajoso, poderoso e polido com algo que muitas bandas de Indie Rock falham redondamente: um elemento de verdadeiro perigo. O luto dá ao álbum um ambiente pós apocalíptico semelhante ao que encontramos no álbum Dog Man Star dos britânicos Suede; estão entristecidos, devastados, e ferozmente apaixonados. Neighborhood #1 (Tunnels) conta a história dum casal de namorados que se encontra no meio da cidade através de túneis que ligam os seus quartos. Através dum piano em constante sofrimento acompanhado por sons de guitarra distorcidos, atingem uma espécie de utopia na qual são incapazes de se recordar dos seus próprios nomes ou até mesmo da cara dos seus pais que choram a sua perda. Não existe melhor forma de começar o álbum, dando um excelente mote para conhecer o trabalho dos Canadianos.
Butler canta como o Johnny Greenwood dos Radiohead tocava, ou seja, como um domador de leões cujo chicote vai encurtando a cada vergastada. Mal se consegue conter e quando se liberta melódica e primitivamente consegue assemelhar-se a David Bowie. A segunda faixa do álbum Neighborhood #2 (Laika) descreve o desespero que conduz ao suicídio numa perspectiva semelhante aos Gang of Four; a “lavagem” hipnótica de cordas e as subtis mudanças de assunto em Neighborhood #4 (7 Kettles) capturam na perfeição a existência mundana da rotina diária; e Neighborhood #3 (Power Out), mostra-nos que o núcleo carregado da alma induz a uma caça aos gambozinos, assente na noção de que"the power's out in the heart of man, take it from your heart and put it in your hand", isto é, que o poder encontra-se no coração do homem; basta passá-lo para as suas acções.
Crown of Love é como um bolo de casamento lançado em câmara lenta, usando um estilo semelhante a Johnny Mandel e um coro leve para dar um toque enriquecedor ao amor de tempos passados e, Haiti recai sobre uma melódica ilha solarenga para caracterizar a terra natal de Chassagne. No entanto, é no âmbito e no poder de Wake Up onde estão os 15 músicos em palco, cantando em uníssono – e o surpreendente batimento dos primeiros anos dos Roxy Music emRebellion (Lies) que Funeral se torna o momento glorioso e marcante que de facto é. Estas são músicas que nos fazem o sangue correr nas veias e o coração bater, e no momento em que Chassagne disseca o seu amor sem limites em In the Backseat com o rádio ligado sendo o fio condutor de Funeral finalmente revelado: o amor é capaz de conquistar tudo, especialmente o amor catársico da música!
Alexandra Silva & Filipe Vilhena