Há 20 anos atrás, Lisboa vivia o drama do incêndio no Chiado, e ainda esse trágico momento estava demasiado presente nas nossas vidas quando nos deparamos com outro: um acidente, a caminho de Leiria para um espectáculo, tirou a vida a Carlos Paião, um dos maiores escritores de canções da sua geração e da segunda metade do século XX.
Carlos Paião desapareceu num trágico acidente de viação, aos 31 anos, ironicamente esmagado pela aparelhagem e pelas colunas de som que transportava no carro. Não me vou alongar mais acerca da sua morte, até porque esta sempre esteve demasiado envolta em polémica, mas sim vou tentar prestar homenagem a este grande senhor que desapareceu demasiado cedo.
No dia em que Carlos Paião morreu, Amália Rodrigues, para quem ele tinha escrito seis anos antes “O Senhor Extra Terrestre” declarou à agência Lusa: Ele era uma pessoa cheia de talento e de vida. Curiosamente, essa é uma das memórias mais fortes que tenho dele, embora nessa altura tivesse apenas 7 anos. Recordo o Carlos como alguém sempre sorridente, bem-disposto, já para não falar do seu talento, pois na altura era algo que não conseguia avaliar. Mas os anos foram passando, e as diversas homenagens que lhe foram sendo prestadas fizeram-me gostar cada vez mais do seu trabalho. E hoje, aquilo que de facto interessa falar e, principalmente recordar é esse seu talento e alegria de viver que se tornava contagiante. Se hoje fosse vivo, teria 51 anos, e citando as palavras de Tozé Brito: Foi na escrita que ele foi totalmente inovador. Se hoje fosse vivo não tenho dúvida de que seria um dos compositores mais requisitados. Seria brilhante. E de facto, não poderia estar mais de acordo com esta declaração, pois acho que, pelo pouco que mostrou, Paião seria hoje um Sérgio Godinho ou até mesmo um Carlos Tê, e talentos destes nunca são demais. Este infelizmente deixou-nos demasiado cedo!
E se de repente toda a nossa vida ficasse virada do avesso? E se uma das pessoas mais importantes desaparecesse para sempre, num acidente trágico e brutal?
E se, depois de tudo isso, a pessoa responsável tivesse a cobardia de fugir...
Com esta premissa, Terry George realiza este filme, que nos deixa sempre a pensar no que fariamos se estivessemos na situação de Mark Ruffalo e Joaquin Phoenix...pais destroçados por um acaso do destino, separados por uma ténue linha que os une. Terry George filma de forma brilhante a dor e sofrimento de duas familias em busca de sossego e tranquilidade cuja vida se cruza de forma quase incrivel...criando todo um drama forte e potente que nos deixa desolados e presos à cadeira.
Joaquin Phoenix tem aqui um papel fenomenal como pai destroçado, procurando todas as formas de superar a morte do seu filho, que sucumbiu de forma trágica depois de um dos momentos mais felizes da família.
Mark Ruffalo surpreende também, encarnando o outro vértice da perigosa situação como a pessoa responsavel (ainda que de forma involuntária) da morte desta pobre e inocente criança. Rufallo, que enfrenta a dor e mágoa pelo que faz, imaginando que o jovem poderia ter sido o seu proprio filho, e que poderia ser outro perfeito estranho a ocupar o seu lugar...
É ainda corajosa a forma como Terry George nos apresenta a história e entrelaça ambas as familias, numa teia muito complicada de tecer e à qual nos faz sentir cada vez mais presos à medida que o enredo avança. Ao contrário de outros filmes do género, George opta por não abordar a visão da vingança e do vigilante, transportando-nos para um mundo real e doloroso, como ele na realidade é, deixando os floreados de lado e fazendo-nos sentir como qualquer um daqueles pais... Uma visão crua e real de uma tragédia, como há muito não se via no cinema.
Os parabéns a este acto arrojado de um grande realizador, que tem também no casting uma escolha acertadíssima, pois não só conforme já referido, Phoenix e Ruffalo estão fenomenais, como a escolha das actrizes para os suportarem (Mira Sorvino e Jennifer Connelly) foi a mais acertada, pois ambas dão um toque ideal, muito emotivo a uma história já de si forte...
Outro papel que está muito tocante é o da pequena Elle Fanning, não deixando por mãos alheias o apelido, e reclamando para si a fama que a irmã (Dakota) já conquistou no mundo de Hollywood.
Em resumo, um filme aconselhado, um dos melhores a estrear nas nossas salas neste ano, mas tendo em conta que pessoas mais sensiveis poderão “sofrer” com a história... e com a pura das realidades que ela retrata.